Diálogos entre Direito & Literatura: O patinho feio

 

O Patinho Feio (Contos de Andersen)Esta é a clássica fábula sobre um estranho patinho que, por ser diferente de seus irmãos, foi ridicularizado e incompreendido pelos outros animais. Mas o destino lhe reservava algo surpreendente: ele cresceria e descobriria sua verdadeira beleza.

Hans Christian Andersen (1805-1875) é um dos maiores escritores da literatura universal. Imortalizado por seus mais de cento e sessenta contos, escreveu também seis romances e mais de mil poemas. Filho de um pobre sapateiro, suas obras refletem uma infância difícil, a luta para ascender socialmente e sua intensa espiritualidade, enraizada na interação do ser humano com a natureza. Traduzida para mais de cem idiomas, a obra de Andersen despertou, com sua profunda consciência moral e religiosa, a fantasia de milhões de crianças no mundo inteiro.  (Amazon)

Comentário:

Para os estudiosos, “Patinho Feio” é o conto de Hans Christian Andersen que mais se aproxima de sua biografia. Assim como o personagem principal do conto, Andersen sofreu opressão diante da sociedade e humilhações por causa de suas origens sociais.

andersen e patinho feio

Diferentemente dos contos de fadas tradicionais, os contos de Andersen não começam com “era uma vez”. Neste aqui, analisado, duas palavras já situam o leitor diante do tempo quando a referência à estação do ano: Manhã de verão! Segue-se então a descrição do espaço com a utilização de substantivos e adjetivos que nos remetem a um local bucólico num lindo dia de verão. Ainda neste primeiro parágrafo aparece a cegonha, personagem que não aparecerá mais na narrativa, mas está presente em várias obras do autor.

Somente no segundo parágrafo, o autor revela um dos personagens principais: a mãe pata. Mesmo à beira da exaustão, a mãe choca seus ovos. O autor faz uso de onomatopeias para concretizar a história, fazendo com que o leitor adentre ao conto – seja através dos personagens, seja através dos acontecimentos.

Os ovos, finalmente, racham. Quando os patinhos nascem, o narrador, que parece contar a história, se aproxima da mãe pata e compartilha com o leitor as opiniões da mãe: “A mãe deixou que olhassem à vontade, pois o verde é sempre bom para os olhos”. Aqui o autor revela parte desta personagem: uma mãe que se interessa pelos filhos.

No entanto, um ovo não racha. Ele é diferente do outro. Uma nova personagem aparece no conto: uma pata velha que questiona a origem do ovo, afirmando que deve ser de ganso. Neste diálogo, entre a mãe pata e a pata velha, o autor ironiza a figura masculina e paterna através da fala da personagem mãe: “Todos puxaram ao pai – o patife! Não aparece nem para fazer uma visita.”

Finalmente o ovo diferente racha e, mais uma vez, o autor utiliza de humor, através da voz da mãe, para anunciar a entrada do personagem principal: “Misericórdia! Mas que patinho enorme!”

A partir do nascimento do patinho feio, a história passa a abordar uma outra questão – que de problemas mais profundos e relacionados ao tema do abandono, da inferioridade e das humilhações.

Andersen também aborda, simbolicamente, questões sociais que se faziam presentes em sua época. Os trechos da narrativa, que possuem uma crítica à sociedade de seu tempo, sempre aparecem na voz de um personagem que, por vezes, representa as hierarquias e as classes sociais daquele tempo.

Patinho feio sofre todas as humilhações, sempre resignado. O leitor é levado a compreender que Patinho Feio terá um final feliz, mas o personagem, durante toda narrativa, não tem entendimento sobre si. Somente no final do conto, quando ele vê seu reflexo na água, entende quem é de verdade.

Os personagens, na maioria animais, possuem voz, falam como gente e tem opiniões. Os primeiros homens que aparecem são caçadores, ou seja, personagens do mal que geram tensão e trazem um pouco da realidade para o conto mágico. Contudo, eles não falam, não possuem nenhuma expressão que não seja através dos sons de suas armas. O acolhimento ao Patinho Feio também não acontece na casa da camponesa e de sua família. Mais uma vez, o personagem se vê perdido, mas parece não compreender, como nós, leitores, o caminho de seu destino.

O autor também traz questões da ética e da estética ao relacionar a beleza como algo ligado à “aristocracia” e ao poder, pois os mais belos são mais fortes e bem sucedidos.

Em todo o texto, Andersen descreve as paisagens e através da natureza nos coloca dentro de um tempo/espaço.

Há passagens mais melancólicas que ganham força com a chegada do inverno. Somente com a chegada da Primavera, uma estação tão simbólica, é que Patinho Feio nada em direção aos cisnes e descobre-se como tal.

E mesmo sendo um cisne, Patinho Feio não é tomado pelo orgulho e vaidade, porque tem um bom coração.

Na finalização, Andersen, novamente, traz à narrativa princípios relacionados principalmente à ética, mas sem deixar uma moral explícita como nas fábulas.

Patinho Feio revela muito a sociedade de uma época, mas ainda é atual porque parece que pouco evoluímos e, especialmente, por que o texto retrata o ser humano e suas relações.

Todos nós conhecemos a história do “Patinho feio”. Um clássico infantil que conta sobre uma pata que estava chocando seus ovos, mas havia um ovo que se distorcia dos outros por ser maior. No desenrolar do conto, sai do ovo um filhote acinzentado e diferente dos demais. Em seu meio era considerado estranho, diferente e feio, e disso passou a ser excluído. Com o passar do tempo, o então “patinho” foi crescendo, e na fase adulta percebe que não era um pato de fato, mas sim um cisne.E qual a relação com o Direito? E, principalmente, o que tem a ver com juízo de valor e juízo de fato?
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Em uma breve introdução, Miguel Reale leciona que há duas espécies de realidade. Uma espécie natural e a outra humana (cultural ou histórica). A primeira é a realidade dada, a “realidade crua”, e, a segunda, a realidade construída, a “realidade cozida”.
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E dessa concepção fica entendido o que é juízo de fato e juízo de valor. Juízo de fato é o mundo da natureza. O princípio da causalidade é quem o rege, se faz inerente às leis naturais, e é independente da atividade humana.
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Já o juízo de valor vai ao encontro da cultura e dos valores associados aos fatos sociais. Ou seja, um fato depende em ser bom ou ruim, justo ou injusto. O juízo de valor é pautado pela regra da imputabilidade. É variado, vez que varia de acordo com o momento, com a época; resumidamente, com a cultura daquela sociedade.
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Remetendo ao conto “O Patinho feio”, é possível perceber que o Direito é ditado pelos valores de uma cultura. Assim, um fato é visto e interpretado de acordo com o meio social inserido. De igual forma a um cisne, embora não sendo considerado como tal, e sim como um patinho feio, os valores sociais tendem a ser incompreendidos. Sua essência permanece intacta, mas sua interpretação é alterada, como ocorre em alguns casos.
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Fonte: Direito e arte: literatura, cinema e interdisciplinaridade. Campo Grande: Editora
Inovar, 2020. 104p.

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