Direito & Literatura: O Alienista

O Alienista - Edição Exclusiva Amazon

Clássico da literatura brasileira, este texto de Machado de Assis continua sendo, cento e trinta anos depois de sua publicação original, uma das mais devastadoras observações sobre a insanidade a que pode chegar a ciência. Tão palpitante quanto de leitura prazerosa, O alienista é uma dessas joias da ficção da literatura mundial. Médico, Simão Bacamarte passa a se interessar pela psiquiatria, iniciando um estudo sobre a loucura em Itaguaí, onde funda a Casa Verde – um típico hospício oitocentista -, arregimentando cobaias humanas para seus experimentos. O que se segue é uma história surpreendente e atual em seu debate sobre desvios e normalidade, loucura e razão. Ensaio sobre a loucura e a lucidez, sátira política e comédia de costumes, esta edição de Machado de Assis conta com uma esclarecedora nota introdutória do crítico britânico John Gledson, um dos grandes intérpretes do autor brasileiro. (AMAZON)

Após anos de estudo fora do Brasil, o Dr. Simão Bacamarte retorna à cidadezinha do Itaguaí, Rio de Janeiro, com seu projeto mais ousado: modernizar os métodos de tratamento para loucos e encontrar o remédio universal para a loucura!

Com o aval do governo, o alienista* põe o plano em prática construindo uma casa para confinar as pessoas loucas da cidade e avançar nos estudos. A instituição, um marco para a medicina local, recebe a alcunha de “Casa Verde” e parece promissora. No entanto, os critérios de Bacamarte para selecionar os moradores da Casa são duvidosos e colocam a população em estados de alerta e insegurança.

Acompanhe os moradores do Itaguaí e a insana empreitada contra a loucura de Simão Bacamarte em “O Alienista”, uma das obras mais surpreendentes de Machado de Assis.

Simão Bacamarte, principal personagem do livro “O Alienista”, de Machado de Assis, queria estudar a mente humana. Construiu a “casa verde”, uma espécie de hospício, local onde enclausurou os ditos “loucos”. Chegou a internar quase 75% das pessoas da cidade de Itaguaí. Depois de algum tempo, libertou-os. Passou a acreditar que os verdadeiros anormais eram aqueles que tinham “firmeza de caráter”, não os furiosos, capturando-os para tratamento. Após, tomado pelas reflexões a respeito da psiquiatria, internou a si próprio, liberando todos os demais, por acreditar que somente um homem com personalidade quase perfeita era de fato um louco.

Essa simples interpretação, quase que ignominiosa a respeito desta célebre obra literária, não tem como objetivo dar um “spoiler” ao leitor sobre o livro de Machado de Assis. A ideia é infinitamente mais simples, na medida em que busca persuadir o leitor de que diferentes pontos de vista, por mais malucos que possam parecer, não merecem ser restritos à “casa verde”, nem extirpados do seio social.

É indiscutível que a sociedade brasileira, atualmente, encontra-se polarizada e politicamente dividida. Os nervos estão à flor da pele. Cada pessoa tem seu ponto de vista e sua visão de mundo sobre o que é o melhor para si e para outrem. É normal, portanto, que em um ambiente social tão conturbado haja conflito de opiniões.

À primeira vista pode parecer exagero comparar a “loucura” analisada por Simão Bacamarte àquelas constantes das mídias sociais, não parecem congruentes entre si. No entanto, a pergunta que fica para quem acompanha esse turbilhão de notícias: Será mesmo?

A polarização política vista nas mídias sociais é uma pequena amostra de que a internet é um instrumento poderoso de canalização de conflitos, e muitas vezes, a depender do prisma em que é observada, parece mesmo beirar a “loucura”. A questão parece alcançar considerável relevância com as denominadas “Fake News”, falsas informações travestidas de notícias, cujo objetivo é confundir ou influenciar pessoas, um poderoso instrumento de desinformação da era pós-moderna.

A “loucura” desta modernidade líquida, contudo, não pode servir à pugnação por menos liberdade. Não existe democracia sem liberdade. Hoje a internet desempenha um papel de destaque às liberdades. Diferentemente das mídias tradicionais, não há falta de espaços, tampouco restrições à participação popular. [1]

A crítica generalizada e os eventuais exageros decorrentes de manifestações que para Simão Bacamarte poderiam ensejar o enclausuramento à “casa verde”, parecem circunstanciais e, por ora, circunscritos a esse momento conturbado da história, não podendo servir de pretexto à supressão da liberdade de quem quer que seja, no ambiente cibernético ou físico.

A Constituição Federal não favorece a censura de qualquer tipo, seja no ambiente cibernético ou físico, sugerindo predileção por mecanismos de contrastação de ideias, com referência expressa ao direito de retificação, resposta e de responsabilização civil por eventuais exageros. O Marco Civil da Internet sinaliza no mesmo sentido, em seu art. 2º, com reiteração nos arts. 3º e 4º, proclamando que “a disciplina do uso da internet no Brasil tem como fundamento o respeito à liberdade de expressão”.

A sociedade atual, portanto, não precisa de tratamento na “casa verde”, precisa se libertar, precisa de liberdade. Informação se contrapõe com mais informação, não com intolerância, restrição ou censura.

Manifestações ásperas na web ou mesmo manifestações artísticas lícitas que celebram a diversidade não podem ser objeto de supressão, ainda que contenham algum exagero ou excesso. O resultado do cerceamento à liberdade é mais nefasto e pernicioso do que conviver com a diferença.

É uma pena não poder convidar Simão Bacamarte a sair da “casa verde”, persuadi-lo a manifestar-se nas mídias sociais e assim celebrar o divino sabor da “loucura” da liberdade.

https://www.conjur.com.br/2019-set-09/opiniao-alienista-liberdade-expressao

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