Diálogos entre Direito e Literatura Grande sertão: veredas

Grande sertão: veredasPublicado originalmente em 1956, Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, revolucionou o cânone brasileiro e segue despertando o interesse de renovadas gerações de leitores. Ao atribuir ao sertão mineiro sua dimensão universal, a obra é um mergulho profundo na alma humana, capaz de retratar o amor, o sofrimento, a força, a violência e a alegria.

Comentário:  esta obra , ao apresentar um personagem que não cessa de se questionar, presta-se como analogia à postura que deveria ser a do estudo do direito: a de questionar-se sempre. 

Daí a atualidade de ‘Grande sertão: veredas’, ao trazer o ambiente social do
final do século XIX às portas do século XXI. O cenário de pobreza e desigualdade
social existente em todo esse período, tem contribuído para a corrupção do direito,
dando oportunidade ao surgimento de instituições paralelas de poder no Brasil,
enfraquecendo as instituições democráticas. Se Guimarães Rosa escrevesse ‘Grande sertão: veredas’ hoje, talvez modificasse apenas o cenário rural para o urbano. Todavia, continuaria a retratar um cenário de verdadeira violência no seio da sociedade brasileira, tanto no campo, quanto na cidade. E exemplos é que não lhe faltariam: facções criminosas ligadas ao tráfico de drogas e de armas, altíssimos índices de assassinatos e de crimes contra o patrimônio, corrupção das instituições políticas… Enfim, uma série de ilegalidades que o Estado brasileiro mal consegue apurar.

Como fruto deste mar de desigualdade gerado pela total falta de atuação do
Estado no sentido de garantir valores constitucionais como educação, erradicação da pobreza, combate à miséria, dentre outros, relega parcela substancial da população à própria sorte, não lhes restando outra via senão entrar para a criminalidade ou então se apadrinha dela, formando verdadeiros exércitos de combatentes ou mesmo de influenciados (ou protegidos) pelos seus chefes. Os chefes dos bandos de Guimarães Rosa certamente guardam muita semelhança aos “Chefões” do crime organizado de hoje, com relações perniciosas com as autoridades constituídas e sendo utilizados como massa de manobra em jogos eleitoreiros. Os medeiros-vazes e zé-bebelos do sertão certamente seriam os membros do Primeiro Comando da Capital – PCC ou do Comando
Vermelho de hoje.
O governo muitas vezes fecha os olhos para esta situação, empurrando para
debaixo do tapete um problema que muitas vezes lhe é benéfico, vez que uma
população aterrorizada, sem cultura, educação e saúde muitas vezes pode ser
influenciada pelos “padrinhos”, a mando dos detentores de verdadeiro poder.

 Fonte: A LITERATURA DESAFIA O DIREITO. GRANDE SERTÃO:
VEREDAS – UMA ANTECIPAÇÃO DO PROBLEMA SÓCIO-POLÍTICO DE SEGURANÇA PÚBLICA NO BRASIL*